Gabiroba, guapeva e murici são frutas comuns no na região Centro-Oeste do Brasil. Mas, apesar da crença popular de que teriam efeitos positivos na saúde humana, nunca foi descrito na literatura o potencial anti-inflamatório e antioxidante dessas espécies. Um estudo pioneiro associando ciência de alimentos e saúde apresenta resultados positivos em relação ao potencial biológico destas frutas. Diante da comprovação, se utilizadas nas indústrias farmacêutica, alimentícia e cosmética, elas devem contribuir no combate ao desenvolvimento de doenças crônico-degenerativas, tais como câncer e diabetes. " As frutas podem ser usadas tanto na forma in natura ou como ingredientes funcionais nessas indústrias" , ressalta a autora do estudo, Luciana Malta.
Essas frutas, devastadas durante o processo mecanizado de " limpeza" e adubação da terra no cerrado, poderiam mudar a história de muitas pessoas na luta contra o câncer e outras doenças. Comparadas a outras drogas já conhecidas no mercado, as frutas apresentaram alto potencial, segundo Luciana, podendo ser usadas no enriquecimento de produtos comestíveis pela indústria alimentícia. " Além disso, seus compostos ativos poderiam ser retirados e encapsulados pela indústria farmacêutica, já que não observamos nenhum nível toxicológico ao testar os extratos em animais" , enfatiza.
Ao aplicar os extratos das frutas em diferentes células cancerígenas humanas, obtidas no banco de células do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA), Luciana também observou um alto potencial anticâncer. " As plantas impediram o crescimento celular" , reafirma. Esse resultado motivou o desenvolvimento de pesquisas com pacientes com câncer do Hospital das Clínicas da Unicamp, em um projeto de pós-doutorado também orientado por Gláucia Pastore. Por não terem sido tóxicas aos animais utilizados na pesquisa e fazerem parte da alimentação da população da região do cerrado, as frutas podem ser testadas em seres humanos com segurança, se consumidas na dose certa, segundo Luciana.
As espécies também demonstraram potencial superior quando comparadas com frutas estudadas nos Estados Unidos, onde Luciana realizou doutorado-sanduíche pela Universidade de Cornell, sob coorientação do professor Rui Hai Liu. " Algumas atividades mostraram que as espécies analisadas são cem vezes mais potentes que outras tidas como frutas de alta atividade" , acrescenta Luciana. De acordo com a pesquisadora, o extrato da casca de guapeva demonstrou alto potencial nos testes in vivo, enquanto a gabiroba foi eficiente em avaliações in vitro.
A parte da pesquisa realizada nos Estados Unidos é inédita, segundo Luciana, e permite que os resultados de experimentos com células sejam obtidos em 24 horas, utilizando uma quantidade mínima de extrato de frutas. " Não é considerada uma análise in vivo, mas ofereceu os mesmos resultados das análises realizadas em animais. Então por que utilizar tanto animal e extrato, se com as células consigo o mesmo resultado?" O método utilizado nos Estados Unidos foi trazido por ela ao Brasil para testar frutas e vegetais brasileiros.
Diante dos resultados, Luciana acentua que a pesquisa não pode ser engavetada, mas sim abrir caminho para que outros testes sejam realizados e os resultados aprimorados até chegarem à fase de produto disponível para a população. Um dos próximos passos é definir a quantidade ideal a ser consumida. " Tudo tem um limite para ser consumido, senão o organismo pode sofrer também com o excesso de algumas propriedades contidas nos alimentos. Então, é preciso avançar na pesquisa" , esclarece.
Devastação
Assim como gabirobas e guapevas, outros vegetais podem estar em risco de extinção no cerrado, devido ao processo acelerado de ocupação agrícola e à exploração extrativista e predatória. As baixas são significativas nas safras dos produtos e há dados de que cerca de 40% do bioma já tenha sido desmatado. O grande apelo do trabalho, na opinião de Luciana, é para a biodiversidade brasileira. " Estamos perdendo esses vegetais e a cura de muitas doenças pode estar nessa biodiversidade" , enfatiza Luciana.
Ela informa que, nos últimos 35 anos, mais de metade da extensão original do cerrado foi substituída por plantações de soja e por pastos para a criação de gado de corte. De acordo com um relatório técnico da Conservação Internacional - Brasil, os desmatamentos anuais na região chegam a 1,1%, representando uma perda de 2,2 milhões de hectares ao ano. " Se esse ritmo for mantido, o bioma será eliminado por volta do ano 2030" , adverte.
Ela acredita que os cientistas também precisam chamar atenção para a devastação do bioma do Cerrado. " Para o Centro-Oeste, principalmente para fazendeiros, vale mais a pena devastar a vegetação e fazer um pasto que manter as frutas. O próximo passo é fazer com que a população se conscientize da importância da manutenção deste bioma. Agora temos dados científicos para chamar atenção tanto da população como também do próprio governo do Centro-Oeste".
Luciana acrescenta que o bioma Cerrado possui uma diversidade grande de frutos importantes na sustentabilidade da região. Com esta enorme biodiversidade criou-se uma tradição de uso de espécies alimentícias, medicinais, madeireiras, tintoriais e ornamentais. As frutas nativas são comercializadas e consumidas in natura ou beneficiadas por indústrias caseiras na forma de sucos, geleias, sorvetes e licores. " O Brasil precisa conhecer melhor sua biodiversidade. Muitos dos frutos do país ainda são desconhecidos ou pouco utilizados" , pondera.
Fonte: I Saúde, Frutas em risco de extinção são eficazes contra câncer e outras doenças crônicas. Estudo comprova propriedades anticâncer em frutas como abiroba, guapeva e murici, que podem ser usadas na indústria farmacêutica. Acesso em 13/11/2012.
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