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ALIMENTOS CONTRA O CÂNCER.

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Dá pra medir quanto um tema é alvo do interesse público e acadêmico quando conferências são montadas exclusivamente para debatê-lo. Então junte algo que fazemos pelo menos três vezes ao dia - todo santo dia - com uma das maiores preocupações da humanidade na esfera da saúde e você tem uma mesa farta para estudos e discussões. Afinal, até que ponto nossa alimentação reduz ou aumenta o risco de um tumor? Essa foi uma das perguntas que nortearam o último Congresso Brasileiro de Nutrição e Câncer/Ganepão, recém-realizado na capital paulista.

Pergunta que move experiências em laboratório e levantamentos populacionais pelo mundo inteiro. E que faz muito sentido, uma vez que, tudo leva a crer, nossas escolhas alimentares pesam em nossa suscetibilidade a tumores. De acordo com Antônio Carlos Buzaid, chefe do Centro de Oncologia Antônio Ermírio de Moraes, do Hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo, embora haja controvérsia sobre o papel isolado de certos nutrientes, já não restam dúvidas de que a dieta pode interferir no destino das nossas células. "Estudos com diversas populações mostram que a ingestão adequada de vegetais diminui a probabilidade da doença", exemplifica. 

É aí que entra e começa a pecar o cardápio do brasileiro. Segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE, nove em cada dez cidadãos consomem menos do que 400 gramas de frutas e hortaliças por dia, meta equivalente a cinco porções e recomendada pelo Fundo Internacional de Pesquisa em Câncer. Esse débito, consequência das rotinas atribuladas e das mudanças no padrão alimentar, só vem contribuir para que os números da doença no país sigam em ascensão - calcula-se que, em 2014, serão mais de meio milhão de novas vítimas. "Em vez de lavar, picar e temperar uma verdura, as pessoas partem direto para o sanduíche com embutidos", descreve o jantar de muita gente a médica Lunamaris de Abreu, da Associação Brasileira de Nutrologia. Hoje se economiza tempo, mas amanhã ou depois...

Parece discurso batido esse de privilegiar os alimentos de origem vegetal, mas o fato é que, até o momento, nada os supera na posição de guarda-costas do organismo. Direta ou indiretamente, substâncias fornecidas por alho, tomate e brócolis impediriam danos ao DNA das células. Esses danos são o primeiro passo para a multiplicação celular perder o controle e dar origem a um tumor. Por serem fibrosos, frutas, verduras e legumes ainda promovem outra blindagem, sobretudo no sistema digestivo. "As fibras favorecem o trânsito intestinal e reduzem o contato das mucosas com moléculas cancerígenas", aponta o nutricionista Fábio Gomes, do Inca. 

No reino animal, enquanto o exagero na carne vermelha é um dos maiores alvos de crítica, a boa reputação continua mesmo a cargo dos peixes ricos em ômega-3, como a sardinha. "A ingestão rotineira dessa gordura está associada a uma queda de 14% no risco de câncer de mama", conta Rita de Cássia Castro, professora de nutrição da Universidade Potiguar, em Natal (RN). E por que o de mama? Eis uma das questões que formam o complexo quebra-cabeça do elo entre alimentação e câncer. Ao que tudo indica, existem áreas do corpo mais sensíveis aos efeitos da dieta.

Uma compilação de dados assinada por autoridades de saúde britânicas informa, por exemplo, que o nível de evidências sobre o impacto das hortaliças na diminuição do risco de câncer de esôfago é de consistência forte. Bem diferente da situação dos pulmões. Ainda não dá para cravar que os vegetais ajudam a prevenir a doença ali. 



Essa complexidade passa por outro ponto: não podemos transpor os achados de laboratório para a realidade do corpo humano. Um caso emblemático foi apresentado pela nutricionista Danielle Fontes de Almeida, de São Paulo, no Ganepão. Estudos com células e ratinhos mostram que compostos do chá-verde são, por vários mecanismos de ação, um petardo anticâncer. Mas os trabalhos clínicos, feitos com populações humanas, não trazem resultados tão animadores assim... 

Embora tenha ingredientes antioxidantes e anti-inflamatórios, o chá-verde não diminuiu a incidência de câncer de mama e cólon, segundo uma revisão epidemiológica englobando 49 mil pessoas. Outro artigo descobriu que tampouco havia vantagem em matéria de próstata. Por outro lado, um trabalho com chinesas captou um impacto protetor frente a tumores mamários. Tudo isso serve para ilustrar que diversos fatores alteram a equação aparentemente simples que faz um alimento minimizar o risco de câncer. Preparo, dose, interação com nossas células e genes... Em tese, o chá-verde pode resguardar você e fazer pouca diferença para o seu vizinho. A nova fronteira da ciência da nutrição é justamente esta: entender, com base no genoma, quem tira proveito do quê... E esse raciocínio não se resumiria às xícaras de chá. 

PARA NÃO SENTIR NA CARNE
Uma dieta saudável não vive de inclusões. Também cobra moderação, talvez uma ou outra exclusão. Nesse sentido, o menu anticâncer pede que você reflita sobre a sua dependência de bifes, hambúrgueres e companhia ilimitada. O conselho para maneirar na carne vermelha vem de um novo estudo da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, envolvendo (só) 88.803 mulheres. Não houve margem de dúvida: tiveram mais câncer de mama aquelas que se fartavam desses alimentos. "Substâncias cancerígenas que surgem durante a exposição da carne a altas temperaturas podem justificar essa relação", diz a pesquisadora Maryam Farvid. Está aí por que o churrasco e a fritura não deveriam ser visitantes diários do seu prato. 

A conclusão de Harvard legitima um dos pilares que sustentam a última diretriz de prevenção da doença da Sociedade Americana de Câncer: limitar a ingestão de carne vermelha e embutidos. A entidade ainda endossa o consumo de vegetais, sugere trocar produtos refinados por integrais, pede cuidado com o álcool e manda ficar de olho no peso, uma vez que a obesidade também financia tumores.

Ora, se alimentos influem na prevenção, será que não dariam suporte a quem passa pela doença? O assunto, claro, não escapou ao Congresso Brasileiro de Nutrição e Câncer/Ganepão, até porque cresce o número de pesquisas verificando como os nutrientes enfrentariam tumores. Em uma das palestras, o nutrólogo Sidney Federmann, de São Paulo, apresentou cases de sucesso sobre o apoio dos alimentos durante o tratamento. "Não proponho substituir cirurgias ou quimioterapias por uma dieta, mas já temos dados de credibilidade que permitem recomendar alguns alimentos como parte do plano terapêutico", diz.



É o que o médico chama de oncologia nutricional. No protocolo desenvolvido por ele, o paciente tem de focar em cereais integrais, sementes, leguminosas, trigo germinado, frutas e verduras cruas e abolir proteínas de origem animal, incluindo o leite - aliás, esse alimento ainda é tema de muita controvérsia em se tratando de câncer.

O socorro dos nutrientes ao longo do tratamento é crucial porque a doença e a própria terapia tendem a fragilizar o indivíduo. "Algumas medicações contra a dor geram constipação e, aí, temos de aumentar a oferta de fibras", exemplifica a nutricionista Ana Gabriela Gouveia, do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo. "Mas, em geral, o paciente deve seguir as bases de uma dieta equilibrada, fracionando as refeições e evitando frituras e industrializados", esclarece.

O acompanhamento nutricional nessas horas faz a diferença porque a fome e o prazer à mesa não raro saem prejudicados em meio ao contra-ataque. Com informações de 4.822 pacientes, o Inquérito Brasileiro de Nutrição Oncológica do Inca constatou que 28,7% deles têm perda de apetite, 14,3% consideram a comida sem sabor e quase a metade diminui mesmo a ingestão total de alimentos. Nada que não possa ser remediado ampliando a variedade do cardápio e recorrendo a truques culinários. Mais que forrar a barriga, os nutrientes que ganham o corpo vão aumentar as chances de derrotar a doença. 


DÊ FLORES AO SEU PRATO
Brócolis, couve-flor, repolho, acelga, rúcula... Essa família, a das brássicas, é motivo de respeito quando se fala em comida com vocação para afastar tumores. Abordados em mais de uma palestra no Congresso Brasileiro de Nutrição e Câncer/Ganepão, esses alimentos são uma senhora fonte de glicosinolatos. Quando tais compostos são cortados e mastigados, há uma reação química que dá origem aos isotiocianatos, substâncias muito estudadas por sua ação anticâncer. "Elas protegem as células de elementos tóxicos como os poluentes", diz a nutricionista Rita de Cássia Castro, professora da Universidade Potiguar (RN). O mais famoso desse grupo, o sulforafano dos brócolis, ainda atua diretamente sobre o DNA, ativando genes supressores de tumores. 

PROTEÇÃO QUE VEM DO MAR















Os jornalistas de SAÚDE são testemunhas de que praticamente não existe um grande evento científico de nutrição que deixe de contemplar o ômega-3, a gordura dos pescados marinhos. Até porque uma de suas propriedades é defender nosso corpo do câncer. Estudos epidemiológicos realizados na Ásia já associam o consumo de peixes ao menor risco de tumores mamários, por exemplo. Isso porque o mais prestigiado dos ácidos graxos tem um belo efeito anti-inflamatório. "Se o corpo vive em um estado de inflamação crônica, ocorrem agressões às células que podem afetar seu material genético", explica o nutricionista Fábio Gomes, do Instituto Nacional de Câncer (Inca). Para evitar esse processo que culmina na doença, dedique três refeições da semana a sardinha, cavalinha, salmão...

DE GRÃO EM GRÃO

...diminuímos a probabilidade de um câncer aparecer. Os grãos, no caso, são de feijão, ervilha, lentilha, soja e até o de bico.

Integram a família das leguminosas, um dos melhores redutos de fibra do planeta. Essas substâncias interagem com a flora intestinal e colaboram para a formação do bolo fecal. Assim, nos domínios do intestino, fazem com que compostos tóxicos sejam eliminados antes de agredirem as células. As vantagens não se restringem à redução no risco do câncer de cólon. Pesquisas já demonstraram uma associação inversa entre a ingestão de fontes fibrosas e a incidência de tumores de mama e pâncreas. Aliás, os grãos escuros, como o feijão-preto, oferecem mais antioxidantes, legítimos zeladores celulares. 

O PURO SUMO DA FRUTA FRESCA



















É de perder a conta o número de substâncias encontradas nas frutas com capacidade de resguardar as células humanas. E a cada dia um estudo é publicado relatando as propriedades de fitoquímicos e afins. Na feira, porém, merece destaque a uva vermelha. Experimentos com o suco de uva integral realizados em cobaias pela biomédica Caroline Dani no Centro Universitário Metodista de Porto Alegre (RS) indicam que seus componentes barram inflamações e danos celulares capazes de levar ao câncer. Mas não precisa viver de uva, não. Trate de comer maçãs, laranjas... Até porque uma revisão assinada por estudiosos chineses revela que a ingestão de frutas em geral afugenta tumores gástricos.

O PARADOXO DO CHÁ-VERDE




















Ele entra na maioria das listas de alimentos que combatem o câncer. "Uma de suas substâncias, a epigalocatequina, suprime a proliferação celular e combate inflamações", diz a bioquímica Elaine Hardman, da Universidade Marshall (EUA). Mas os resultados dos estudos clínicos com a bebida ainda nos fazem questionar seu real efeito protetor. 

ESPANTA ATÉ TUMOR


















O alho encabeça a seleção de alimentos anticâncer escalada pelo famoso oncologista francês David Khayat, do Hospital Pitié-Salpêtrière, em Paris. Segundo o professor, o tempero defende principalmente o esôfago, o estômago, os rins e o intestino. Seu talento? "Ele tem um antioxidante poderoso, a alicina", entrega Khayat. "Essa substância estimula o sistema imune a detectar e destruir células cancerosas e ainda pode induzir o suicídio dessas unidades defeituosas", explica. Aproveitamos melhor a alicina quando o alho chega ao prato cru, mas a versão cozida ainda agrega pitadas dela. 

COMA COM OS OLHOS


















É que as cores ajudam a reconhecer uma qualidade dos vegetais: a presença de pigmentos que, dentro do organismo, labutam contra o câncer. Exemplos clássicos são o licopeno do tomate e o betacaroteno da cenoura e da abóbora. Ambos são antioxidantes de primeira, que anulam os radicais livres capazes de danificar o DNA. E olha que eles se tornam mais operantes após passar pela panela. "Os nutrientes da cenoura, por exemplo, são mais absorvidos pelo corpo depois que ela é cozida", diz o nutrólogo Sidney Federmann, de São Paulo. 

BENDITOS MICRÓBIOS
Probióticos são aquelas bactérias benéficas incorporadas a leites fermentados e alguns iogurtes. E já existem fortes indícios de que eles cumprem um papel na prevenção do câncer. É que, por ajudarem a preservar a integridade da mucosa intestinal, minimizam a possibilidade de lesões malignas aparecerem ali.


MODERAÇÃO POR FAVOR 
Abusar com frequência de alguns alimentos pode aumentar o risco de câncer. Entenda por que eles exigem bom senso 

O REBANHO AGRADECE

Quem não dispensa carne vermelha no almoço e no jantar precisa rever esse hábito. O alerta vem de estudos populacionais que ligam seu consumo exacerbado ao câncer. Isso porque, apesar de ser fonte de proteína e ferro, ela está cheia de ácido graxo araquidônico. "Trata-se de um tipo de gordura saturada com perfil pró-inflamatório", explica a nutricionista Rosângela Passos, da Universidade Federal da Bahia. Se a inflamação é persistente, você já sabe... ponto para os tumores. Já há indícios, aliás, de que ferro em demasia e subprodutos formados na digestão da carne contribuam para danos permanentes às células. Melhor não extrapolar demais a cota de 300 gramas por semana. 

E é bom ter cuidado com o ponto! Quando a carne é tostada demais - especialmente na grelha do churrasco -, ela fica impregnada de elementos cancerígenos. Esse fenômeno acontece quando um bife é exposto a mais de 3.00oC. Por isso, os nutricionistas sugerem priorizar, no dia a dia, o cozimento na panela.

DOÇURA DEMAIS ESTRAGA



















açúcar refinado também está pisando nos tribunais do câncer. E pode levar com ele refrigerantes, biscoitos e outros doces. Para o nutricionista Fábio Gomes, a acusação reside no fato de que seu abuso é um dos patrocinadores da pandemia de obesidade - e esta, por sua vez, deixa o terreno fértil para tumores. Só que a biologia já tem outra explicação que ligaria o apetite de formiga ao maior risco da enfermidade. Quando se enche a barriga de guloseimas e se esquece das fibras, bactérias patogênicas se proliferam no intestino. "E esse ambiente facilita a absorção de compostos carcinogênicos", revela Rosângela. 

PERIGO NO HOT DOG

Ninguém vai propor que você nunca mais coloque a salsicha no meio do pão ou petisque um salaminho com os amigos vez ou outra. Mas esses presentes ao paladar devem ser vistos rigorosamente como exceções na rotina. É que os embutidos - e lembre-se de que falamos também de presuntos, mortadelas e linguiças defumadas - têm conservantes, os nitritos e nitratos, que, ao interagir com o suco gástrico da digestão, se transformam em nitrosaminas. "Elas podem se ligar ao DNA e atrapalhar a confecção de proteínas que regulam o ciclo celular", descreve Gomes. Aí já viu... De um erro microscópico surge um problemão. Além disso, embutidos costumam vir lotados de sódio e gordura saturada, outros sabotadores do organismo. 

SOBROU ATÉ PARA O SAL
Pois é, exagerar nas pitadas ou nos produtos industrializados não descompensa só a pressão. Trabalhos feitos na Ásia mostram que pessoas que abusam do molho à base de soja, um poço de sódio, sofrem mais com o câncer de estômago e de esôfago. 




















VAI DEPENDER...
Confira no infográfico informações importantes sobre como certos fatores interferem na maneira como os alimentos são absorvidos pelo nosso organismo (a ilustração é de Sérgio Bergocce).


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