A obesidade e seu precedente imediato, o sobrepeso, são duas das grandes
"epidemias" da vida moderna.
Paradoxalmente, são consequências indesejadas da melhora generalizada do
nível de vida das pessoas e do maior acesso a alimentos mais refinados, ricos em
proteínas mas também em gorduras, carboidratos e açúcares.
O que se discute hoje é se a melhor solução para os que enfrentam a obesidade
ou o sobrepeso é uma terapia, medicamentosa ou não, ou fazer exercícios para
melhorar a condição física.
Nos Estados Unidos, por exemplo, há um jogo de palavras entre "fatness" e
"fitness" - em tradução livre seria "gordura física" versus "aptidão
física".
Quem explica o dilema entre ficar bem ou ficar acima do peso é o Dr. Jorge
Trejo-Gutierrez, diretor do Programa de Reabilitação Cardiopulmonar da Clínica
Mayo.
A obesidade e o sobrepeso são realmente um problema de saúde pública
no mundo?
Sim. Tanto que foi criado o termo "globesidade" para refletir o aumento de
pessoas obesas em todo o mundo. Nos últimos 30 anos, o número de obesos cresceu
de forma preocupante na Europa Ocidental e Oriental, nos Estados Unidos, Canadá,
Ásia Oriental, América Central, América Latina tropical, Norte da África e
Oriente Médio.
Que fatores determinam o peso de uma pessoa?
São vários. Há fatores genéticos, ambientais e, obviamente, o hábito de
ingerir mais energia do que a que se gasta. Até agora, se vê os fatores de risco
do sobrepeso e da obesidade com um foco linear, de causa e efeito. Porém, de uma
maneira geral, as doenças não transmissíveis surgem de uma interação da economia
de mercado livre leva à globalização, urbanização, mecanização, todos fatores
que facilitam o aumento da obesidade e de uma variação em nível mundial, como é
também o caso das mudanças climáticas. Isso indica que existem os chamados
"sistemas adaptativos complexos" em vários níveis. A obesidade pertence a essa
categoria de sistemas.
Como se trabalha com pacientes obesos ou com sobrepeso?
Recomenda-se ações que podem ser agrupadas em três grandes categorias:
identificação, informação e recomendação.
O primeiro passo é identificar os pacientes que precisam perder peso, medindo
o perímetro de sua cintura e calculando seu IMC. Os atuais valores da
Organização Mundial da Saúde, que definem uma pessoa com sobrepeso (IMC maior
que 25,0 a 29,9 kg/m2) ou obesidade (IMC igual ou maior que 30 kg/m2), permitem
identificar os adultos com alto risco de sofrer doenças cardiovasculares. Além
disso, um adulto com IMC igual ou superior a 30, ou seja, obeso, tem um alto
risco de mortalidade por várias causas.
Que informações são transmitidas ao paciente?
Ele é informado, por exemplo, que quanto maior seu IMC e o perímetro de sua
cintura, maior é o risco de sofrer doenças cardiovasculares, diabetes do tipo II
e risco de morte por múltiplas causas. É informado também de que fatores de
risco cardiovasculares podem surgir, como hipertensão arterial, hiperglicemia e
hiperlipidemia, mas, se perder peso, ainda que pouco, conseguirá melhoras
significativas em seus níveis de triglicerídeos e açúcar no sangue, assim como
uma baixa no risco de desenvolver diabetes do tipo II. Com maior perda de peso,
de uma forma constante, é possível baixar a pressão arterial, melhorar os níveis
de colesterol e conseguir uma redução maior dos níveis de glicose e
triglicerídeo e, com isso, reduzir as doses de remédios para controlá-los.
Quais são as recomendações?
Há dois grandes grupos. O primeiro se refere à dieta necessária para perder
peso - uma dieta de 1.200 a 1.500 calorias diárias, para mulheres, e de 1.500 a
1.800, para homens. Mas isso varia conforme o peso do paciente. Ou uma dieta de
"déficit calórico", que consiste em reduzir em 500 a 750 calorias,
respectivamente para mulheres e homens, a ingestão calórica considerada "normal"
para o paciente.
É útil restringir o consumo de alimentos ricos em carboidratos e gorduras e
baixos em fibra. E é aconselhável colocar o paciente nas mãos de um
nutricionista.
O segundo é recomendar uma mudança mais ampla no estilo de vida, incentivando
a realizar atividades físicas em acordo com suas condições de saúde e ser
apoiado, pelo menos por seis meses, por sessões individuais ou de outras
pessoas.
A atividade física é fundamental?
Sim. A inatividade física tem um impacto na saúde pública comparável ao tabagismo. O risco de morte
por doença cardiovascular em pessoas com peso normal, sobrepeso e obesidade é
bem maior nos que fazem pouca ou nenhuma atividade física, em comparação com as
pessoas que, com o mesmo peso, se exercitam regularmente. O ideal é combinar
exercícios com uma alimentação mais saudável e promover mudanças no estilo de
vida, para evitar, por exemplo, situações de ansiedade.
Que conselho se pode dar a quem não consegue baixar o
peso?
Que participe de programas, por pelo menos um ano, em que se ensina técnicas
para manter o novo peso por muito tempo, com controles de pessoal qualificado,
que os levam ao compromisso de manter um nível de atividade física relativamente
alto: praticar exercícios de 30 a 45 minutos por dia, em média, controlar o peso
ao menos uma vez por semana e consumir uma dieta baixa em calorias.
Caminhar é o que chamamos "um bom passo". Já foi determinado que, a cada dois
mil passos adicionais ao dia, se consegue uma redução de 8%, em média, de
eventos cardiovasculares. Hoje, existe no mercado o pedômetro (ou "conta
passos") e outros monitores que motivam a pessoa a realizar atividades
físicas.
Qual é a sua reflexão final sobre a obesidade?
Para fazer frente à obesidade e seu tratamento, há que se abandonar os modelos
lineares e compreender que esse é um tema muito complexo. Aceitar que há fatores
imponderáveis, respeitar a autonomia do paciente, ser criativo e flexível.
Dentro dessa consideração de novos enfoques, está a corrente que promove a
dieta alimentar chamada de "flexitariana", originada há cerca de 20 anos nos
Estados Unidos e que propõe uma dieta vegetariana com certa flexibilidade. Ou
seja, a pessoa pode consumir produtos de origem animal, porém com menor
frequência. Por exemplo, pode não ingerir qualquer alimento derivado da carne
branca ou vermelha, nem sequer "embutidos", mas pode consumir uma pequena
quantidade de carne, não mais que 100 gramas, no jantar.
A menor ingestão de produtos de origem animal melhora a saúde cardiovascular,
é uma prática amigável ao meio ambiente, que pode até influir, favoravelmente,
nas atuais tendências de mudanças climáticas.
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